Quando uma mãe foi assassinada dentro do carro, em frente à filha adolescente, em 2016, em Porto Alegre, um grupo no WhatsApp formado por amigos empresários ficou lotado de mensagens de preocupação. A mulher esperava o filho mais novo na saída da escola quando foi abordada por assaltantes e levou um tiro na cabeça, mesmo sem reagir.

O grupo do WhatsApp estava alarmado com a crescente insegurança da capital gaúcha. Naquele ano, Porto Alegre registrou 55,6 homicídios a cada 100.000 habitantes – quase o dobro da taxa brasileira no mesmo período, de 29,7 homicídios. A Organização Mundial da Saúde (OMS) considera uma epidemia de assassinatos quando são registrados mais de dez casos a cada 100.000 habitantes. Porto Alegre, portanto, vive uma epidemia de homicídios segundo o órgão. Os dados (veja gráfico abaixo) são do Instituto Cultural Floresta (ICF), baseado nos números do IBGE, do DataSUS e do Anuário de Segurança Pública.

O ICF foi criado por dois amigos daquele grupo de WhatsApp: Leonardo Fração, presidente, e Cláudio Goldsztein, presidente do conselho da entidade. A indignação com a onda de violência foi transformada em atitude. A dupla conseguiu arrecadar 14 milhões de reais, doados por 55 empresários, que preferem não se identificar, para equipar as polícias gaúchas – tanto a Militar quanto a Civil. O instituto não tem vínculo com partidos.

Com a verba milionária, foram comprados novos veículos, armamentos, coletes à prova de bala, GPS e rádios para comunicação. Os equipamentos serão entregues oficialmente ao governo gaúcho em 28 de março. “A violência é um problema absolutamente ‘democrático’. Todas as classes sociais são prejudicadas. Elegemos o problema mais urgente a ser resolvido”, disse Fração a VEJA.

Os empresários respondem as possíveis críticas de que as doações seriam em interesse próprio dos doadores, visando à proteção a seus negócios. “Com o dinheiro doado, eles poderiam cuidar de si e dos seus familiares, pagando segurança privada. Não faria sentido [doar]”, explica Goldsztein.

Porém, ambos reconhecem que uma cidade mais segura é melhor para a economia como um todo, seja através da permanência de empresas em Porto Alegre, seja pela maior circulação de pessoas na rua e, consequentemente, mais consumo.

“É surpreendente que [a doação] nunca tenha acontecido. [Os doadores] são os verdadeiros empresários, que pensam não só na empresa, mas nas famílias e na sociedade. Não adianta ter uma empresa saudável em meio ao caos”, disse Fração.

Os empresários respondem as possíveis críticas de que as doações seriam em interesse próprio dos doadores, visando à proteção a seus negócios. “Com o dinheiro doado, eles poderiam cuidar de si e dos seus familiares, pagando segurança privada. Não faria sentido [doar]”, explica Goldsztein.

Porém, ambos reconhecem que uma cidade mais segura é melhor para a economia como um todo, seja através da permanência de empresas em Porto Alegre, seja pela maior circulação de pessoas na rua e, consequentemente, mais consumo.

“É surpreendente que [a doação] nunca tenha acontecido. [Os doadores] são os verdadeiros empresários, que pensam não só na empresa, mas nas famílias e na sociedade. Não adianta ter uma empresa saudável em meio ao caos”, disse Fração.

A doação dos 14 milhões de reais e a compra dos equipamentos não recebeu nenhuma isenção tributária, explicam os líderes do ICF. Caso tivesse, eles alegam que seria possível comprar pelo menos o dobro de material para as polícias. Os empresários pretendem, nos próximos cinco anos, doar mais 300 milhões de reais por meio da construção de dois presídios, compra de 1.000 carros, 10.000 pistolas e 5.000 bolsas de estudo.

A escolha dos itens comprados foi baseada na indicação da Secretaria de Segurança Pública (SSP) do estado. Os empresários conversaram com o secretário Cezar Schirmer, que apontou os equipamentos mais necessários.

O Instituto Cultural Floresta não encontrou iniciativas do mesmo porte no Brasil, pelo menos não com uma quantia semelhante aos 14 milhões de reais doados. Entretanto, boas ideias foram vistas em Monterrey, uma das cidades mais violentas do México, e no estado americano da Califórnia. Em Monterrey, empresários se aproximaram das polícias e de órgãos de segurança para apoiá-los, ocupando um espaço abandonado pelos políticos eleitos. Na Califórnia, empresários auxiliam as famílias de policiais mortos em serviço. “Lá eles ajudam as famílias porque os policiais não precisam de equipamento”, compara Fração.

Este texto foi criado originalmente por: Veja.